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VAR em Foco: Ex-Procurador do STJD Desvenda o Caso Goiás x Athletic e o Pedido de Anulação

Por Redação FutGoiás em 27/06/2025 14:44

O cenário do futebol brasileiro foi agitado recentemente por uma decisão no mínimo controversa envolvendo o Árbitro de Vídeo (VAR) na partida entre Athletic e Goiás, válida pela Série B. O clube goiano, sentindo-se lesado por uma intervenção que considerou irregular, prontamente protocolou um pedido de impugnação do confronto junto ao Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD). A alegação central do Goiás é a de que houve um "erro de direito" por parte da arbitragem, argumentando que a revisão de um segundo cartão amarelo não se enquadra nas situações passíveis de análise via VAR.

A dúvida que paira no ar é se um lance tão específico, envolvendo a reversão de uma penalidade disciplinar, tem o poder de invalidar um resultado de campo. Para desvendar essa intricada questão, que coloca em xeque a interpretação do protocolo do VAR e as normas do Direito Desportivo, buscamos a expertise de uma das vozes mais respeitadas no assunto: Paulo Schmitt, ex-procurador do STJD.

Análise Jurídica: Erro de Fato x Erro de Direito no Futebol

Paulo Schmitt, figura de proa no Direito Desportivo nacional, com uma vasta experiência como procurador do STJD entre 2004 e 2016, oferece uma perspectiva crucial sobre o caso. De acordo com o especialista, que atualmente atua como consultor jurídico em diversas confederações esportivas, o caminho para a anulação de uma partida é estreito e exige a configuração de um "erro de direito", algo que ele não vislumbra na situação em tela. Para compreender a distinção fundamental que sustenta sua análise, é imperativo diferenciar os dois tipos de erro:

Tipo de Erro Definição
Erro de Fato Ocorre quando o árbitro interpreta ou observa incorretamente um acontecimento em campo.
Erro de Direito Caracteriza-se pela aplicação equivocada de uma norma, como expulsar por uma conduta não prevista em lei ou revisar um lance de maneira absolutamente não prevista no protocolo.

Com base nos documentos oficiais da partida, nas ações da arbitragem e nos argumentos apresentados pelo Goiás para buscar a impugnação, Schmitt é categórico ao afirmar que o incidente não se enquadra na definição de "erro de direito".

? É necessário que se configure um erro de direito, ou seja, a aplicação equivocada de uma norma desportiva cogente, da regra do jogo ou do regulamento e não um erro de fato, que seria uma avaliação ou interpretação equivocada do árbitro sobre um fato ou lance da partida.

O ex-procurador reforça que a própria regulamentação da International Football Association Board (IFAB), órgão responsável pelas regras do futebol, é explícita quanto à validade dos jogos em cenários de falhas do sistema ou da operação do VAR. Ele destaca que o VAR é considerado um membro adicional da equipe de arbitragem, e, portanto, equívocos em sua utilização são tratados como "erro de fato".

?No caso do VAR, o protocolo da IFAB deixa claro que decisões erradas envolvendo o VAR, revisões indevidas ou até o mau funcionamento do sistema não invalidam a partida. Isso ocorre porque o VAR é considerado um árbitro adicional, e eventuais erros de sua operação configuram erro de fato?.

? Portanto, um erro de operação do VAR, por si só, não gera nulidade da partida. Para que fosse considerado erro de direito, seria necessário que a arbitragem aplicasse regra inexistente ou deixasse de aplicar regra obrigatória de maneira contrária ao regulamento de competições ou à própria regra do jogo, o que não se verifica neste caso ? declarou Schmitt.

VAR em Foco: Ex-Procurador do STJD Desvenda o Caso Goiás x Athletic e o Pedido de Anulação
Foto: (Divulgação)

O Lance Controverso e a Súmula da Partida

Para entender a raiz da controvérsia, é fundamental revisitar o momento exato em que a confusão se instalou. Aos 12 minutos da etapa complementar, uma infração foi assinalada a favor do Athletic, próxima à área do Goiás . O goleiro Adriel, conhecido por sua habilidade em cobranças de bola parada, deslocou-se para o campo de ataque com a intenção de executar o tiro livre.

Contudo, o árbitro Alexandre Vargas Tavares de Jesus interpretou a movimentação de Adriel como uma tentativa de retardar o jogo ou tumultuar a partida. Consequentemente, o juiz aplicou o segundo cartão amarelo, culminando na expulsão do arqueiro. Pouco tempo depois, o próprio árbitro dirigiu-se à cabine do VAR, revisou o incidente e reverteu a punição, anulando os cartões.

A súmula do jogo, documento oficial da arbitragem, detalha a situação sob a ótica do juiz. O registro indica que a revisão foi iniciada por suspeita de um "incidente grave despercebido" (em inglês, serious missed incident), termo que possui respaldo direto no protocolo de operação do VAR, elaborado e atualizado pela IFAB.

? Aos 11 minutos do segundo tempo, o árbitro da partida iniciou uma revisão e solicitou imagens ao árbitro de vídeo por haver suspeitado que algo grave passou despercebido (incidente grave despercebido).

?Ao analisar as imagens, ficou evidente que o goleiro da equipe visitante não se dirigiu à bola com a intenção de retardar o reinício da partida ou reclamar com a arbitragem, mas sim para realizar a cobrança do tiro livre direto?.

? Diante disso, os cartões aplicados (vermelho e amarelo) foram anulados, e a partida foi reiniciada a partir da situação de jogo em que havia sido paralisada ? diz a súmula.

O Protocolo do VAR e a Validade do Jogo

Embora a revisão de um cartão amarelo (seja ele o primeiro ou o segundo) não esteja explicitamente listada entre as situações que justificam a intervenção do VAR, Paulo Schmitt aponta para dispositivos no protocolo que permitem uma interpretação mais abrangente. A chave reside na cláusula de "incidente grave despercebido", que concede ao árbitro a prerrogativa de iniciar uma revisão caso suspeite de algo sério que não foi devidamente notado em tempo real.

"Revisar um segundo cartão amarelo isoladamente não é permitido. No entanto, o mesmo protocolo prevê que, caso o árbitro suspeite de um incidente grave não percebido, pode iniciar a revisão".

No caso específico, a súmula indica que a revisão não se limitou à avaliação do segundo amarelo, mas sim à verificação de uma conduta passível de expulsão direta ou outro incidente de gravidade. Ao constatar que não houve intenção de retardar o jogo, mas sim uma tentativa legítima de cobrança de falta, o árbitro optou por anular as penalidades. Schmitt avalia essa decisão como uma aplicação correta do protocolo.

? No caso concreto, conforme a súmula, a revisão não foi apenas para avaliar o segundo amarelo, mas sim para verificar se havia ocorrido conduta passível de expulsão (cartão vermelho direto) ou outro incidente grave. Ao constatar que não houve retardamento de jogo (conduta antidesportiva) nem reclamação, mas sim tentativa de cobrança de falta, o árbitro anulou os cartões.

?Na minha avaliação, o princípio da decisão tomada dentro do campo prevalece, pois o árbitro utilizou a previsão de revisão por ?incidente grave despercebido?, prevista no protocolo, para corrigir o que seria uma punição injusta?.

Adicionalmente, o protocolo da IFAB, na seção "Validade da partida" (Match Validity), é claro ao estabelecer que, em princípio, um jogo não é invalidado por determinadas ocorrências relacionadas ao VAR. Essa clareza reforça a posição de Schmitt sobre a baixa probabilidade de anulação.

Situações que NÃO Invalidam a Partida (Protocolo IFAB)
Mau funcionamento da tecnologia VAR (ex: tecnologia da linha de gol - GLT).
Decisão(ões) errada(s) envolvendo o VAR (pois o VAR é um árbitro da partida).
Decisão(ões) de não rever um incidente.
Revisão(ões) de uma situação/decisão não passível de revisão (como no caso em questão).

O Argumento do Goiás e o Desfecho Provável

Apesar da robustez da análise de Paulo Schmitt e da clareza do protocolo da IFAB, o Goiás , por meio de seu advogado João Vicente, mantém a posição de que houve uma transgressão direta às regras. O clube sustenta que a regulamentação é explícita ao limitar a consulta ao monitor à beira do campo apenas a situações como expulsão por cartão vermelho direto, gols, pênaltis e erros de identificação. Para o departamento jurídico esmeraldino, a decisão de revisar um segundo cartão amarelo, mesmo sob a égide do "incidente grave despercebido", configura um "erro de direito" por ir contra o que estaria previamente estabelecido.

João Vicente confirmou ao ge o ingresso do pedido junto ao Superior Tribunal de Justiça Desportiva, reiterando que o árbitro Alexandre Vargas Tavares de Jesus cometeu "erro de direito" ao consultar o Árbitro de Vídeo (VAR) em um lance de expulsão por segundo cartão amarelo, não passível de revisão.

No entanto, a interpretação predominante no Direito Desportivo, conforme elucidado por Paulo Schmitt, aponta para um desfecho desfavorável ao pedido de impugnação do Goiás . A distinção entre "erro de fato" e "erro de direito" é crucial, e a flexibilidade do protocolo do VAR em situações de "incidente grave despercebido" parece blindar a decisão da arbitragem de uma anulação. A partida, ao que tudo indica, não será invalidada, e o resultado de campo deverá ser mantido, reforçando a complexidade e os desafios da aplicação da tecnologia no futebol.

Paulo Schmitt, além de sua notável atuação como ex-procurador-geral do STJD e da Justiça Desportiva Antidopagem, acumula diversos outros cargos de prestígio. Ele é formado e pós-graduado em Direito Financeiro e Direito Desportivo, atua como consultor jurídico e de integridade das Confederações de Ciclismo, Ginástica, Esgrima e do Conselho Regional de Educação Física da 9ª Região (Estado do Paraná). Adicionalmente, preside a área de integridade da Federação Paulista de Futebol e integra o Comitê de Integridade e Apostas Esportivas do SIGA (Sports Integrity Global Alliance), credenciais que atestam sua autoridade no tema.

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Comentado em 27/06/2025 19:03 Se é loko, VAR confunde mesmo, deixa pra próxima!
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Comentado em 27/06/2025 16:51 Aff mano, essa arbitragem vacilou feio, mas Goiás é gigante e vai dar a volta por cima, confio!
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